sexta-feira, 3 de junho de 2011

Má-alimentação e sedentarismo marca 'geração fast-food' carioca

Todos sabem que crianças adoram hambúrguer, batata frita, biscoito recheado e refrigerante. No entanto, quando a maioria dos adolescentes só consome esse tipo de alimento, e não faz exercício - configurando o que se convencionou chamar de "geração fast-food" - não apenas elas, quanto os pais e até o governo passam a ter um problema.

Afinal, se alimentar à base desses tipos de produtos (repito, batata frita, refrigerante, hambúrguer e biscoito recheado diariamente) e entre as verduras, só alface, criou o que já pode ser visto nas ruas, para horror dos idealizadores de "Garota de Ipanema". Estão obesos, são sedentários e candidatos a doenças cardiovasculares no futuro.

Os dados fazem parte da tese de doutorado Avaliação Nutricional de Adolescentes em Função de Doenças Cardiovasculares, defendida na Universidade do Estado do Rio de Janeiro pela nutricionista Vera Chiara. Ela entrevistou 526 jovens entre 12 e 18 anos por amostra probabilística. Segundo Vera, esse universo é representativo de 400 mil adolescentes - 80% da população nessa faixa etária.
Descrição: http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_images/bullet.gifEscolas cariocas investem em alimentação saudável
"Adoro ricota", disse Eduardo Gonçalves Borba, de 8 anos, à reportagem do jornal o Estado de São Paulo. O garoto afirma preferir o lanche natural porque tem medo de engordar. "Se eu ficar gordo vai ser difícil brincar." A preocupação que antes era exclusivamente feminina, agora se dá em todas as idades e cada vez mais cedo.
As escolas estão incutindo isso nas crianças, na tentativa de frear gigantesca onda de obesidade, que se tornou uma patologia mundial. Bolinho de soja, pizza de farinha integral, quiche de legumes, suco de frutas. Não se trata do cardápio de nenhum restaurante natural, mas do lanche oferecido por algumas escolas da classe média do Rio.
A Miraflores, de Niterói, tem um dos cardápios mais "radicais": cortou de vez hambúrgueres, refrigerantes e doces e passou a oferecer frutas frescas, barras de cereais, salgados de forno à base de farinha integral. Exceção para um tipo de fritura: o quibe de carne de soja.
O cardiologista Carlos Scherr diz que os colégios precisam preocupar-se seriamente com os seus estudantes. Pesquisa feita por ele com 342 crianças de 6 a 16 anos, em oito instituições do Rio, mostrou que 23% dos alunos da rede particular têm colesterol elevado. Nas escolas públicas, esse índice é de apenas 4%. "Crianças pobres brincam de pegar, jogam futebol e têm merenda escolar balanceada. As outras se distraem com tevê, computador e recebem uma alimentação sem preocupação nutricional. As cantinas são terceirizadas e estão ali para ganhar dinheiro."
Doença de adulto

A hipertensão vem afetando crianças e pode ser corrigida com mudança de hábitos alimentares

Salvo escoriações e fraturas típicas de crianças levadas, as doenças de infância sempre foram dor de garganta, sarampo, catapora, caxumba e rubéola. Hoje a obesidade e os problemas decorrentes, como hipertensão, diabetes e colesterol, mais comuns em pessoas de idade adulta, afetam crianças do mundo todo. A estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de que mais de 42 milhões de crianças com menos de 5 anos estejam acima do peso ou sofram de obesidade no mundo.
O mais alarmante é a hipertensão, doença silenciosa, que não apresenta sintomas. Mais de 95% de toda a pressão arterial alta é do tipo hipertensão essencial, causada por fatores genéticos e ambientais, como a ingestão de sal em excesso. Já a hipertensão arterial secundária é assim denominada porque a elevação da pressão é causada por outro problema, como doença nos rins, entre outras patologias. "Quanto menor a criança, mais grave é a hipertensão, e aí investiga-se a causa. Já na fase pré-adolescente, a hipertensão é associada à obesidade na ordem de 35%", explica a nefropediatra do Hospital Sabará, Maria Cristina Andrade.
A médica lembra que, se antes as crianças tinham peso normal ou eram anêmicas, hoje, como resultado das comodidades da vida moderna, têm sobrepeso ou são obesas (46% da população brasileira, segundo pesquisa do Ministério da Saúde). "Para a pressão voltar a níveis normais sem medicamentos, a criança ou adolescente deve perder peso e praticar uma hora e meia de exercícios aeróbicos todos os dias." Família, sociedade e escola, alerta, são corresponsáveis no processo de reeducar a geração de gordinhos.
Segundo Frida Plavnik, nefrologista e conselheira da Sociedade Brasileira de Hipertensão, não se sabe ao certo o porcentual de crianças hipertensas no Brasil, mas fala-se que gira em torno de 1% a 3%. O primeiro contato da criança com o sal, diz ela, se dá com a papinha. Os hábitos serão herdados do paladar da mãe, e é aí que mora o perigo, já que o brasileiro consome duas vez mais sal do que o recomendado pela OMS, que é 6 gramas por dia ou uma colher de chá.
Somadas ao sedentarismo, as guloseimas são as vilãs da saúde das crianças. Por isso, os pais devem ficar atentos aos rótulos das embalagens, alerta a nefrologista. O sódio, um dos componentes do sal de cozinha, não está apenas nos alimentos salgados, mas também nas bolachas doces recheadas, em conservantes (nitrito de sódio e nitrato de sódio), adoçantes (ciclamato de sódio e sacarina sódica), fermentos (bicarbonato de sódio) e realçadores de sabor (glutamato monossódico).
"O mineral representa um papel importante em diversas funções do organismo, principalmente no equilíbrio entre os fluidos celulares e extracelulares. Atua também na transmissão de impulsos nervosos em todo o corpo, permitindo assim o funcionamento do cérebro e o controle de nossas funções vitais. O problema é o excesso", explica Frida.
Para detectar alguma alteração e fazer um diagnóstico precoce, o controle da pressão arterial deve ser feito a partir dos 3 anos, nas visitas ao pediatra. "Os níveis de pressão arterial variam de acordo com o sexo, idade e altura, existindo tabelas que permitem ao médico verificar se a pressão arterial se encontra em níveis adequados."
Responsabilidade dos pais. Quando o pai ou a mãe é hipertenso, a chance de o filho ser é de 25%. E se ambos têm a doença, a probabilidade é de 60% . Portanto, se o problema existe na família, os pais devem pensar duas vezes antes de encherem o carrinho do supermercado com alimentos ricos em sódio, elemento diretamente relacionado com a pressão arterial elevada e outros problemas, como derrame cerebral, catarata, problemas renais e até mesmo casos de câncer no estômago.
Coordenada pelo cardiologista Daniel Magnoni, uma pesquisa do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia com 1.294 hipertensos mostrou que 93% não sabem fazer a distinção entre o sal e o sódio descrito nas embalagens, 75% nem sequer leem os rótulos e 45% não sabem que os produtos industrializados podem conter sal.
O brasileiro tem o costume de ingerir 14 gramas de sódio por dia, alerta o médico, lembrando que o mineral está presente em embutidos, alimentos industrializados, conservas envasadas em latas e vidros, molhos, sopas e caldos prontos, e refrigerantes. Para calcular o teor da substância, deve-se multiplicar o valor de sódio no rótulo por 2,5 - o resultado indica o correspondente em gramas de sal. Um alimento com 500 mg de sódio, por exemplo, representa 1,25 g de sal.
Outra pesquisa feita entre 2003 e 2009, por médicos do Hospital Pro Criança Cardíaca, no Rio, com 2 mil pacientes na faixa de 5 a 20 anos, mostra que 53,2% dos jovens e crianças têm excesso de gorduras no sangue; 63% se alimentam de forma errada; 2% são hipertensos; 47,4%, sedentários, e 7,5% estão acima do peso. Sobre o estudo, a cardiologista e fundadora do hospital, Rosa Célia, observa que não há diferença de hábitos alimentares entre as classes sociais, uma vez que o acesso aos salgadinhos, fast food, iogurtes, hambúrgueres, refrigerante, doces é muito fácil. O resultado é que os pequenos apresentam níveis altos de colesterol e alteração da pressão arterial como jamais se viu antes.
"Se fizessem uma pesquisa para saber o que as crianças levam para a escola, os biscoitos seriam os campeões. Por que não levar uma fruta?" Para a médica, os maus hábitos alimentares estão relacionados às idas ao supermercado, número de horas em frente à TV e às mães que trabalham fora, deixando as crianças com babás ou empregadas, que soltam as rédeas.
Segundo a médica, a família pode colaborar, aderindo aos hábitos saudáveis. "Caso contrário, como a criança vai comer cenoura com uma geladeira cheia de iogurte? Ela briga, reage, mas quer ser cuidada."
A BUSCA CORPO PERFEITO
Várias pessoas ultrapassam os limites na busca do corpo perfeito e compram a idéia de que obter uma aparência de modelo é mais importante do que a manutenção da própria saúde. Na ânsia por resultados imediatos, sem esforços, muitos recorrem indiscriminadamente a alternativas como equipamentos de ginástica passiva, aplicação de fosfatidilcolina (dissolução de gordura localizada), bronzeamento artificial, moderadores de apetite, entre outros métodos.
Nesse cenário, o crescimento da comercialização de medicamentos e produtos para emagrecimento sem registro na Anvisa preocupa as autoridades sanitárias, que têm como uma de suas competências a fiscalização do comércio e da propaganda desses produtos.
Um dos principais problemas do uso indiscriminado de medicamentos é o risco de intoxicação. De acordo com dados do Sistema Nacional de Infecções Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), em 2001 foram registrados 75 mil casos de intoxicação humana. Desses, 21 mil (28% dos casos) foram causados por medicamentos. Os dados mostram também que as mulheres são as principais vítimas de intoxicação por remédios, principalmente os moderadores de apetite.
Segundo informações da Anvisa, em 2003, com a participação de algumas Universidades das cinco regiões do País na monitoração das propagandas de medicamentos, foram apreendidos 78 produtos comercializados sem registro e suspensas nove peças publicitárias, que divulgavam produtos sem registro, para perda de peso. A população tem papel fundamental nesse esforço, ao denunciar a comercialização e a propaganda de produtos irregulares.
Para os que ignoram a recomendação e adquirem produtos sem registro, a Gerência de Monitoramento e Fiscalização de Propaganda, Publicidade, Promoção e Informação de Produtos sujeitos à Vigilância Sanitária alerta: “A Anvisa não pode responder pelos males que eles provocam à saúde”.
Embora o registro na Agência seja um fator a ser observado, engana-se quem pensa que ele representa passe livre para o consumo de medicamentos sem orientação de um profissional de saúde.

No caso dos moderadores de apetite, por exemplo, o acompanhamento médico é fundamental. Esse tipo de medicamento é visto como um dos últimos recursos a serem utilizados, exclusivamente para os casos de obesidade mórbida. Por serem compostos por complexos anfetamínicos, ansiolíticos, laxantes, diuréticos, entre outros, podem gerar dependência física e psíquica.

Fonte: ANVISA

Em busca do corpo perfeito

Desde a Grécia Antiga, os homens correm atrás de um corpo ágil, capaz de alcançar cada vez mais velocidade, força e destreza. Mas a história do esporte, escrita pelos Jogos Olímpicos, mostra diferentes motivações para essa conquista

Carlos Eduardo Matos (Carlos Eduardo Matos) , Paola Gentile, Ricardo Falzetta Design: Sonia Schwartz
ANTIGÜIDADE
A perfeição dos Deuses
Na Grécia Antiga, os homens — só eles tinham esse direito — malhavam por um físico ideal de inspiração divina Atleta, ginástica, estádio, pentatlo — ligadas ao esporte, todas essas palavras são de origem grega. Na Grécia Antiga, berço da civilização ocidental, surgiu a idéia do corpo perfeito conquistado por meio da atividade física. Os homens helênicos não se envergonhavam de exibir-se despidos em jogos e danças. Mais do que isso, gostavam de se admirar. Eles perceberam que a nudez, além de bela, melhorava o desempenho do atleta, sobretudo nas competições periodicamente disputadas na península grega, os Jogos Olímpicos.
Deuses e homens
A celebração das divindades por meio de provas físicas expressava as concepções politeístas dos gregos. Eles consideravam os deuses semelhantes aos homens em virtudes e defeitos, sujeitos às mesmas paixões e impulsos, embora dotados de imortalidade e de força, velocidade e beleza superiores. Assim, desejar um corpo belo, forte e rápido era um meio de se aproximar dos deuses e, com isso, da perfeição.
Não era somente essa busca divina que fazia os gregos dedicar especial atenção ao corpo. Para a Grécia, ter bons atletas entre os cidadãos significava contar com soldados fortes e resistentes, preparados fisicamente para combater os exércitos das cidades-estado vizinhas. Não por acaso, provas como a corrida e o lançamento de dardo tiveram origem no treinamento militar, que era feito dentro do gymna-syum, a academia da época.

Os mais famosos e importantes jogos esportivos eram os que ocorriam a cada quatro anos em Olímpia, na cidade-estado de Elis, para homenagear Zeus, o deus supremo do Olimpo. Os primeiros registros dos vencedores datam de 776 a.C., mas há indícios de que as competições já eram realizadas 500 anos antes. Os Jogos Olímpicos assumiram tamanha importância que os antigos gregos os utilizaram como medida de tempo: a palavra olimpíada designava o intervalo de quatro anos entre dois períodos de competição — e até hoje é assim. Além disso, durante as provas, realizadas em agosto e setembro, qualquer guerra em curso na região era suspensa para que os cidadãos pudessem se deslocar até Olímpia a fim de aplaudir seus campeões. Se as guerras eram precedidas de sentimentos de tristeza, inquietação e medo, a disputa dos jogos gerava disciplina, método, respeito e uma alegre expectativa. Toda essa movimentação amargava um detalhe: as mulheres não participavam das competições nem podiam assistir a elas.


Força e velocidade
As primeiras competições olímpicas se limitavam a corridas. Ao longo do tempo, foram introduzidos o pentatlo — no qual um atleta disputava em um mesmo dia provas de salto, lançamento de dardo e de disco, corrida e luta — e as corridas de biga. Também surgiu uma forma primitiva de boxe, em que tudo era válido a não ser mordidas e dedos nos olhos. Inicialmente, os vencedores recebiam apenas a coroa de louros. Com o tempo, viraram profissionais disfarçados, com direito a prêmios e privilégios.

O surgimento da filosofia, no final do século 7 a.C., colocou as crenças religiosas tradicionais em segundo plano e enfatizou a importância da construção de um corpo perfeito. Dessa vez, o modelo não eram os deuses mas o próprio homem, qualificado como "medida de todas as coisas". Platão sustentava que "ginástica e música, uma intercalada com a outra", eram a fórmula do equilíbrio entre corpo e espírito. Ele próprio foi um lutador, e o nome pelo qual ficou conhecido se originou da palavra platys (largo). Tudo por causa dos ombros fortes do filósofo, cujo verdadeiro nome era Arístocles.

Os romanos não mantiveram o ideal olímpico dos gregos. A qualidade física e a técnica apurada perderam importância, abrindo espaço para disputas quase circenses e cada vez mais violentas. O objetivo dos governantes era distrair o povo com espetáculos grandiosos. Buscando a liberdade, escravos confinados e submetidos a rígido treinamento tornaram-se astros — os gladiadores. Provas puramente atléticas, como as corridas rasas e o arremesso de dardo e disco, chegaram a ser alvo de zombaria dos espectadores.

Nesse cenário, que atingiu seu ápice no século 2, o poeta satírico Juvenal mencionou a máxima mens sana in corpore sano. Dada a personalidade irônica atribuída ao autor, nunca se soube exatamente qual sentido ele pretendeu dar a essas palavras.

NA ESCOLA
  • Proponha aos alunos que recortem de revistas imagens de atletas de provas rápidas e de fundo e que as comparem. Leve-os a notar a diferença na massa muscular e nos tipos de roupa e acessórios.
  • Conte à turma uma das versões da história da maratona, prova que exalta o soldado grego Fidípedes. Diz a lenda que, na guerra contra os persas, em 490 a.C., ele correu 40 quilômetros, da cidade de Maratona a Atenas, pedindo reforços pelo caminho. Voltou com 10 mil soldados, que venceram a batalha. Inflamado, o comandante ordenou ao esforçado Fidípedes que voltasse a Atenas (correndo!) para dar a notícia. Extenuado, Fidípedes deu o recado, mas caiu morto.

    Sugestões do professor Laércio Pereira, do Centro Esportivo Virtual(www.cev.org.br)
RENASCIMENTO
A Arte para exaltar a beleza
Escondido, como tudo na Idade Média, o corpo sob medida volta à cena séculos depois e é celebrado na expressão artística

No ano 393, o imperador romano Teodósio, convertido ao cristianismo, proibiu os Jogos Olímpicos (que seriam retomados somente no final do século 19), vendo neles uma "manifestação pagã". A medida expressava as concepções da nova religião dominante, que identificava os antigos deuses a demônios e qualificava como pecado a exibição dos corpos nus dos atletas. Durante a Idade Média (do século 5 ao 15), o corpo foi considerado perigoso — em especial o feminino —, um "lugar de tentações". Alguns teólogos chegaram a dizer que as mulheres tinham mais conivência com o demônio porque Eva havia nascido de uma costela torta de Adão, portanto nenhuma mulher poderia ser reta.

Em tais condições, a nudez sofreu uma repressão severa. Mesmo os nobres, que se exercitavam regularmente e disputavam torneios de cavalaria, escondiam o corpo com trajes volumosos, apesar do desconforto que o excesso de tecido causava aos praticantes. As pessoas conservavam as roupas até durante o banho — hábito, aliás, pouco freqüente nos castelos, conventos e entre a população em geral, pois acreditava-se que a sujeira era uma proteção contra as epidemias (em especial, a peste), que ameaçavam a saúde pública. Há registros de que os monges do mosteiro de Cluny, na França, tomavam dois banhos completos por ano.


A redescoberta do corpo
No final do século 12, houve uma retomada do comércio e da vida urbana em boa parte da Europa ocidental e foram redescobertos, em traduções árabes, os textos dos pensadores greco-romanos, perdidos no início da Idade Média. Tudo isso levou a uma mudança da mentalidade vigente. Surgiu um novo tipo de intelectual, o humanista, que via no homem a medida de todas as coisas, como os filósofos gregos. Esse pensamento influenciou pintores, escultores e artistas em geral, que retomaram os padrões da Antigüidade clássica em suas obras. O processo, conhecido como Renascimento, atingiu o auge nos séculos 15 e 16 e teve como berço as cidades da península Itálica.

A arte renascentista celebrou abertamente o corpo e a beleza física. A mulher, antes ligada ao pecado, reapareceu, seminua e deslumbrante, em O Nascimento de Vênus, tela de Sandro Boticelli pintada em 1485. Michelangelo Buonarroti enfatizou a beleza e a harmonia do corpo masculino em seu Davi, escultura apresentada ao público florentino em 1504, e na imagem de Adão, pintada no teto da Capela Sistina entre 1508 e 1512. E Leonardo da Vinci imortalizou, na gravura conhecida como O Homem Vitruviano (1492), o equilíbrio e as proporções da figura masculina.

Nas cortes, o guerreiro rude deu lugar a um novo padrão masculino. Assim como muitos artistas do Renascimento foram simultaneamente pintores, escultores e arquitetos, os nobres do período deviam ser versáteis, conhecer os clássicos, compor poemas e canções para suas musas e dançar com a mesma elegância e destreza com que empunhavam a espada.


Esse ideal de diversidade se manteve nos séculos seguintes, nos círculos de elite, reforçando a necessidade dos exercícios físicos. Observa o historiador Jacques Revel em "Os Usos da Civilidade" (História da Vida Privada 3): "O adestramento dos corpos é uma arte de sociedade. Realizado em público, prepara para a vida na corte. Daí a importância da equitação na formação das jovens elites: ela prepara para exercícios coletivos, a caça, a guerra, o passeio; porém começa pela exigente aprendizagem da postura".


Segundo o antropólogo português Jorge Crespo, até por volta do século 18 acreditava-se que o corpo era apenas o "irremediável resultado de uma herança" genética. Aos poucos, com o crescimento das cidades e o surgimento de novas ocupações, o físico passou a ser mais exigido. Por motivos de saúde, de higiene e de necessidade para o trabalho cada vez mais repetitivo e especializado (eram os primeiros sinais da Revolução Industrial), a prática de exercícios deveria ser estendida para a maioria da população e não restringir-se ao esporte de elite. Assim entra o corpo no século 19.
NA ESCOLA
Inspirado na gravura O Homem Vitruviano, de Leonardo da Vinci, organize com a sua turma um boletim de antropometria (medidas do corpo humano). Com registros periódicos da altura total, da altura tronco-cefálica (sentado), envergadura e peso, todos poderão acompanhar o próprio crescimento. Nesse boletim, você pode incluir também algumas marcas, desde que decida com os alunos o que será medido. Por exemplo, tempos de corrida e de saltos para medir a impulsão vertical e a horizontal.

Sugestões do professor Laércio Pereira, do Centro Esportivo Virtual(www.cev.org.br)
ERA MODERNA

O corpo a serviço do esporte
Superação de limites, quebra de recordes, vitória a todo custo. A competição suga ao máximo a capacidade física dos atletas
Os esportes de massa surgiram com uma série de transformações na vida urbana. As cidades ganharam melhores serviços de saneamento, de saúde e de lazer. Com isso, tornaram-se comuns hábitos coletivos, como o de freqüentar cafés e restaurantes e praticar atividades físicas ao ar livre. A Inglaterra — cenário de mudanças desde a Revolução Industrial — foi também o berço dos esportes coletivos, tendo como origem as atividades praticadas em colégios e universidades. As competições de barcos a remo, por exemplo, receberam impulso em 1829, ano do primeiro desafio entre Oxford e Cambridge, que se repete até hoje; o futebol ganhou um regulamento unificado em 1843 — as regras de Cambridge — e 20 anos depois passou ao controle de uma associação nacional; o boxe adotou em 1867 normas propostas pelo marquês de Queensberry. Em 1880, os ingleses fundaram uma Associação Atlética Amadora.

Rapidamente as inovações se espalharam pelo mundo. Em 1892, o barão francês Pierre de Coubertin propôs a reedição dos Jogos Olímpicos. Em sua opinião, a "exportação de atletas" seria o "comércio livre" do futuro e um instrumento para a paz mundial. Quatro anos depois, o rei da Grécia, Jorge I, abriu os primeiros jogos da era contemporânea.


A meta é a superação
Durante todo o século 20, as competições foram marcadas pela superação de limites. Alguns exemplos: a marca mundial de nado crawl caiu cinco vezes em 1956, em Melbourne, Austrália; em 1968, na Cidade do México, o recorde de salto triplo foi superado nove vezes em apenas quatro horas; o tempo da maratona masculina caiu de 2 horas, 58 minutos e 50 segundos (40 quilômetros em Atenas, 1896), para 2 horas, 6 minutos e 49 segundos, recorde pertencente ao corredor etíope Tesfaye Jifar. Isso levando-se em consideração que desde 1924 o percurso tem oficialmente 2 quilômetros e 195 metros a mais.

Mas o que levou a essa sucessiva quebra de marcas? Além do avanço das ciências e da tecnologia de materiais — como a adoção da fibra de vidro nas varas para salto, em 1964 —, o marketing esportivo é um dos maiores incentivadores do alto rendimento, patrocinando atletas, financiando a cobertura esportiva e movimentando a indústria.

As pesquisas científicas contribuíram com descobertas sobre o organismo humano e seu funcionamento, revelando diversas condições que levam um corpo a render mais. Hoje, cada atleta tem treinamento personalizado e alimentação baseada nas necessidades pessoais de nutrientes . Os estudos na área da genética rapidamente permitirão identificar, desde a infância, um potencial campeão.


A farmacologia também dá sua contribuição, mas por caminhos às vezes tortuosos. Muitas drogas sintetizadas para a cura de doenças, descobriu-se, também levam o corpo a superar limites. Ignorando princípios éticos e colocando a própria saúde em risco, atletas dispostos a vencer a qualquer preço passaram a fazer uso de anabolizantes para aumentar a massa muscular, de diuréticos para reduzir o peso do corpo e de hormônios para favorecer a redução de gorduras e ajudar na construção dos músculos. Essas drogas, de uso condenado no esporte, levaram a várias "quebras" de recordes. Pegos no antidoping, alguns atletas chegaram a perder suas medalhas — como Ben Johnson, em 1988. Mas nem sempre os exames que controlam a dopagem avançam na mesma velocidade do uso inadequado dessas substâncias.
NA ESCOLA
  • Organize na sua escola uma olimpíada intraclasse, dividindo a turma em dois clubes, para disputar provas por categoria. Ou faça um torneio interclasses, desde que organizado por série. Atividades competitivas, quando planejadas de forma a não promover a exclusão de alunos, promovem a colaboração, a partilha do tempo, o respeito e a valorização do outro. Para isso, basta dar um toque cooperativo à competição e combinar regras com os alunos. Em salto em distância ou em corrida, por exemplo, você pode propor que as equipes vencedoras sejam definidas com base na soma dos resultados individuais ou de dois em dois ou quatro em quatro alunos.

    Sugestões do professor Laércio Pereira, do Centro Esportivo Virtual(www.cev.org.br)
ATITUDE CAMPEÃ

O importante é viver bem
Cada indivíduo pode trabalhar seu corpo conforme as necessidades que tem — no esporte ou na vida
Quase tudo já vivido por Daiane dos Santos, 21 anos, jogou contra a brilhante carreira trilhada por ela na ginástica olímpica. Filha de uma família de classe média baixa de Porto Alegre, ela começou a praticar o esporte aos 12 anos, idade em que a maioria das ginastas disputa competições internacionais. Na época, já tendo menstruado, Daiane surgiu como uma rara atleta, com seios grandes e formas curvilíneas. Seu índice de gordura corporal, de 8 a 9%, também está acima da média do esporte, na faixa dos 4%.
Negra, enfrentou preconceito dentro de um ambiente de maioria branca. Seus primeiros treinadores chegaram a incentivá-la a procurar o atletismo por causa da força descomunal que mostrava ter nas pernas. Um único detalhe a igualava às demais meninas da ginástica: a baixa estatura — 1,45 metro —, que, aliada à força muscular, sempre a habilitou para realizar acrobacias como ninguém.

Hoje, o "Dos Santos", salto que somente Daiane executa, é um divisor de águas, honra máxima para a pequenina brasileira voadora, que superou todas as dificuldades graças à determinação típica de uma campeã. Considerado pelos juízes um movimento de grau "Super E", o mais difícil na escala que começa na letra A, o duplo twist carpado, batizado com o sobrenome de Daiane, virou meta de todas as companheiras de esporte. Para a autora, um degrau a superar em Atenas, caso alcance a perfeição no ainda mais difícil duplo twist estendido.

Agarra de Daiane assemelha-se à de outro brasileiro de excelentes resultados. Aos 25 anos, Erick Epaminondas tem um currículo invejável para quem começou no basquete há apenas nove: é tricampeão brasileiro e campeão sul-americano. Jogou na Itália por três meses e está a caminho da Grécia, onde participará pela primeira vez das Paraolimpíadas. O atleta da equipe de basquete em cadeira de rodas ADD/Magic Hands teve poliomielite. A falta de força nas pernas nunca foi barreira para ele deixar de usar o corpo na busca por seus objetivos. Depois de muito exercício específico para a modalidade, Erick tem hoje o físico adaptado ao esporte. "Eu era muito magro e tinha pouca massa muscular. Agora que meu corpo está mais adequado, procuro investir na técnica", diz.

Os exemplos de Daiane e Erick são extremos, mas ensinam a todos (inclusive a seus alunos!). Leia o projeto da Professora Nota 10 de 2003, Josefa Iranilde Dantas Santana, sobre a busca por uma aparência ideal. "Não existe mais um modelo de corpo saudável a ser seguido", confirma Alex Branco Fraga, professor da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. "Cada esportista cultiva o físico de acordo com seu tipo e as necessidades do esporte", ressalta. O mesmo acontece com as pessoas comuns. Apesar da massacrante propaganda de corpos "sarados" e "bombados", o professor alerta que, por baixo de formas trabalhadas a qualquer custo, há sempre uma saúde debilitada.
HISTÓRIA DE CONQUISTAS
Ouro para um pastor
As poucas modalidades olímpicas disputadas nos Jogos de 1896, em Atenas, são praticadas por amadores. O vencedor da maratona é um pastor de ovelhas, o grego Spiridon Louis, que vira herói.
Da paralisia ao pódio
Ray Ewry teve pólio e, até os 8 anos, se locomoveu em cadeira de rodas. Nos jogos de 1900, com 26 anos e a força que adquiriu nas pernas depois de muita terapia, "voa" na pista de Paris e ganha ouro nas três provas de salto parado (sem corrida).
Mulheres na jogada
Paris, 1900: começa a participação feminina e 11 elegantes senhoritas disputam os torneios de tênis e de golfe. A inglesa Charlotte Cooper é a primeira mulher a levar a medalha de ouro, ao vencer a final de simples, no tênis.
Velozes na raça
1904, Saint Louis: o americano Thomas Poage, bronze nos 400 metros com barreira, sobe no pódio e marca outro tento. Ele é o primeiro negro a receber uma medalha olímpica.
Recordes femininos
Em 1928, as mulheres já estão competindo pesado. Representam agora 10% dos atletas participantes e quebram recordes mundiais nas cinco provas de atletismo disputadas em Amsterdã. A canadense Ethel Catherwood salta 1,59 metro e bate o recorde do salto em altura.
Apesar de Hitler
1936, Berlim: o nazismo tenta provar pelo esporte a "superioridade" dos arianos. Mas os negros vencem todas as corridas nas distâncias entre os 100 e os 800 metros, ganhando oito medalhas de ouro (quatro para Jesse Owens), três de prata e duas de bronze.

Tênis para quê?
Correndo por fora — descalço! —, o etíope Abebe Bikila vence pela primeira vez a maratona, em Roma (1960), mostrando que os negros, além da supremacia nas provas de velocidade, se destacam também nas corridas de fundo.

Menores e melhores
Olga Korbut, 17 anos, e Nadia Comaneci, 14, ambas com 1,49 m, derrubam o padrão das competidoras de ginástica olímpica, até então mais velhas e corpulentas. Olga (Munique, 1972) ameaça o ouro, mas escorrega nas barras assimétricas. Quatro anos depois, Nadia honra as baixinhas: leva três ouros, uma prata e um bronze. É eleita a ginasta mais completa da competição.

A escalada do doping
Em Seul (1988), o canadense Ben Johnson consagra-se o homem mais veloz do mundo. Mas sua glória é efêmera: o antidoping revela uso de anabolizantes. Hoje, o doping químico corre o risco de se tornar obsoleto, dando lugar ao doping genético. A nova versão se caracteriza pelo uso de um vírus sintetizado em laboratório que altera a informação genética das fibras musculares sem deixar vestígio no sangue ou na urina do competidor.